Serra do Baturité, uma riqueza cearense – Parte 2 - Ymbu Agroflorestal

Serra do Baturité, uma riqueza cearense – Parte 2

Com uma biodiversidade exuberante, a APA da Serra do Baturité possui um grande valor ecológico. É um pedaço do Brasil riquíssimo, sobre o qual contamos no nosso post anterior (leia aqui).

Abrangendo biomas de Mata Atlântica, Mata Seca e Caatinga, a Serra do Baturité ocupa uma área de 32.690 hectares ao Nordeste do Ceará. E este é o endereço de uma grande variedade de plantas de padrões fisionômicos e florísticos e também de 335 espécies de animais, sendo 20 anfíbios, 51 répteis, 35 mamíferos e 229 aves.

Devido ao isolamento físico provocado pelas características geográficas da região, a APA da Serra de Baturité contém algumas espécies que só se encontram neste local, representando um verdadeiro banco genético de biodiversidade. Entre eles, destacam-se aves como Saí-Tucano, Sanhaçu, Fura-Barreira, Soldadinho, Verdelino, Coandu, Pintassilgo, Soim, Tamanduá Mambira e Gato Maracajá.

“A fauna da região é bastante variada”, conta Patricia Jacauna, gestora da APA. “Muitas espécies, porém, estão na lista vermelha da International Union for Conservation of Nature’s (IUCN), mas gostaria de frisar um dado importante: algumas precisam de atenção especial. É o caso do periquito-cara-suja (Pyrrhura griseipectus) que, em 2018, ganhou uma área especial, o REVIS Periquito Cara Suja (Decreto N° 32.791, 17 de agosto de 2018), com 49,12 hectares no município de Guaramiranga.”

Segundo Patricia, outras espécies foram recentemente descritas na IUCN. São elas: Coendou baturitensis (mamífero, conhecido como porco-espinho de Baturité), Adelophryne baturitensis (anfíbio, conhecido como rãzinha de Baturité), Leposoma baturitensis (réptil) e Macrophyes pacoti (aracnídeo). “Estes quatro exemplos demonstram o quanto precisamos cuidar e proteger nossa região”, ressalta a gestora, que coordena diversas atividades em prol da biodiversidade.

Proteger para preservar

A Gestão da APA, coordenada por Patricia, no entanto, não está sozinha. Quem também atua na região é a Aquasis (Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos), uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, fundada em abril de 1994, com missão de desenvolver ações e pesquisas para preservação da biodiversidade e o uso responsável dos recursos naturais no Nordeste do Brasil, estimulando mudanças de atitude para a construção de uma sociedade sustentável.

A ONG desenvolve ações e pesquisas para conservação de espécies altamente ameaçadas e seus habitats, conduz campanhas de sensibilização e informação junto às comunidades rurais e urbanas locais para promover um uso mais responsável dos recursos naturais, promove programas de educação ambiental e colaboração técnico-científica com instituições conservacionistas nacionais e internacionais.

A atuação da Aquasis concentra-se no Nordeste do Brasil com espécies-bandeira e em habitats críticos para a conservação da biodiversidade, realizando levantamentos de áreas e espécies prioritárias, conduzindo processos de criação e manejo de Unidades de Conservação, desenvolvendo atividades de campo para conservação in situ da biodiversidade e conduzindo campanhas de conscientização e envolvimento comunitário. A Aquasis prioriza trabalhos com as espécies mais ameaçadas de extinção do Ceará – o periquito cara-suja, o soldadinho-do-araripe, o maçarico-de-papo-vermelho e o peixe-boi – e outras espécies ameaçadas por atividades antrópicas, como o boto-cinza, e espécies em colapso populacional, como o uru-do-nordeste.

“A estratégia para evitar a extinção dessas espécies se baseia na conservação de áreas prioritárias, através do envolvimento da sociedade local, da criação, apoio à gestão de Unidades de Conservação (públicas e privadas) e biologia interventiva”, explica Fabio Nunes, secretário executivo da ONG e coordenador do Projeto Periquito Cara-suja.

“A Aquasis começou um trabalho na serra de Baturité em 2006, inicialmente focado na tentativa de evitar a extinção do periquito cara-suja”, conta Nunes. “Desde então, conseguimos reverter o declínio populacional para um aumento populacional significativo, utilizando ninhos artificiais. A Serra de Baturité representa o último significativo ambiente onde a espécie resistiu, pois foi extinta de mais de 15 áreas onde já ocorreu em diversas serras do Nordeste brasileiro. Com o passar do tempo, o periquito cara-suja assumiu papel de espécie-bandeira, tornando-se uma estratégia favorável para o envolvimento da sociedade na conservação.”

De acordo com Nunes, o apelo simbólico do periquito cara-suja hoje é reconhecido no mundo todo e tem sido usado na promoção de proteção da Serra de Baturité, beneficiando outras espécies ameaçadas e a própria população humana, que depende da recarga hídrica da região. “Proteger a floresta da serra de Baturité é garantir recarga hídrica para milhares de seres humanos”, afirma o secretário executivo da Aquasis.

A prática conhecida como bird watching (observação de pássaros) vem crescendo na Serra do Baturité, e motivos não faltam, como podemos ver nas fotos deste post, e muitos deles precisam deste local para viver, pois é o único que possuem. Por isso, sua proteção é tão urgente. “A fauna e flora da serra de Baturité possuem endemismos e diversas espécies ameaçadas de extinção. Somente entre as aves, a metade dos 23 táxons ameaçadas de extinção do Ceará é encontrada na Serra de Baturité (MMA, 2014)”, afirma Nunes.

Veja a lista de animais já ameaçados:

– Tucaninho (Selenidera gouldii baturitensis) (EN, MMA)

– Chupa-dente-do-nordeste (Conopophaga cearae) (VU, MMA)

– Uru (Odontophorus capueira plumbeicollis) (CR, MMA)

– Saíra-militar (Tangara cyanocephala cearensis) (VU, MMA)

– Arapaçu-de-garganta-amarela (Xiphorhynchus guttatus gracilirostris) (VU, MMA)

– Choca-da-mata (Thamnophilus caerulescens cearensis) (VU, MMA)

– Vira-folha-cearense (Sclerurus cearensis) (VU, MMA)

– Maria-do-nordeste (Hemitriccus mirandae) (VU, MMA; VU, IUCN)

– Jacú-verdadeiro (Penelope jacucaca) (VU, MMA; VU, IUCN)

– Pintassilgo-do-nordeste (Spinus yarrelli) (VU, MMA; VU, IUCN)

– Arapaçu-rajado-do-nordeste (Xhiphorhynchus atlanticus) (VU, MMA)

– Periquito cara-suja (EN, MMA; EN, IUCN)

“Destas, a maioria tem ocorrência dependente desse ambiente de refúgio úmido para sobreviver, isto é, não ocorre na Caatinga e estão, portanto, isolados”, explica Nunes. “Além disso, a serra possui registro de oito mamíferos, dois répteis e um anfíbio ameaçados de extinção.”

Espécies da fauna ameaçadas de extinção:

Mamíferos:

– Cachorro-vinagre (Speothos venaticus) (MMA, VU)

– Gato-pintado (Leopardus wiedii) (VU, MMA)

– Gato-do-mato (Leopardus tigrinus) (EN, MMA; VU, IUCN)

– Onça-parda (Puma concolor) (VU, MMA)

– Panthera onca (extinta localmente) (VU, MMA)

– Gato-maracajá (Puma yagouaroundi) (VU, MMA)

– Rato rato-da-árvore (Rhipidomys cariri) (VU, MMA)

– Mocó (Kerodon rupestres) (VU, MMA)

Répteis:

– Cobra-da-terra-dos-brejos (Atractus ronnie) (VU, MMA)

– Lagarto-de-baturité Leposoma baturitensis (EN, MMA) (ROBERTO & LOEBMANN, 2016)

Anfíbio:

– Adelophryne baturitensis (VU, IUCN) (ROBERTO & LOEBMANN, 2016)

Espécies da flora também integram a lista de ameaça de extinção. São seis, no total:

– Guzmania monostachia (VU, MMA)

– Guzmania sanguínea (EN, MMA)

– Vriesea wawranea (EN, MMA)

– Erythroxylum pauferrense (EN, MMA)

– Myrcia isaiana (EN, MMA)

– Adenophaedra cearensis (CR, MMA)

Segundo Nunes, dos endemismos desta região, as seguintes espécies só têm registro para a serra de Baturité: as plantas Adenophaedra cearensis, Phyllanthus carmenluciae e Vriesea baturitensis; o anfíbio Rhinella casconi e a subespécie de ave Selenidera gouldii baturitensis. Além disso, diversas espécies no Ceará só têm registro para o Maciço de Baturité ou em poucos ambientes de refúgio do Estado, nos brejos de altitude.

Fotos: Fabio Nunes | Divulgação Aquasis